Quando o companheiro de equipe cruzou as linhas inimigas e saqueou o camisa 9 adversário, a bola oval pipocou alguns metros no gramado sintético do imponente estádio dos Dallas Cowboys, uma das franquias mais bem sucedidas da história do futebol americano.
Restavam pouco mais de 2 minutos para o fim da partida.
Era bola viva. Recuperá-la, aquela altura significava a vitória dos donos da casa e mais: uma classificação para a segunda rodada dos playoffs, algo que não acontecia há muito tempo, desde os anos dourados da franquia em meados da década de 1990.
DeMarcus Lawrence.
Foi ele o responsável por capturar a bola. Jogador dos Cowboys. Vitória. Classificação. Sonho de vencer o Super Bowl mantido. Preservado no coração de todos torcedores que assistiam a partida nos confortáveis assentos no estádio e aos milhares que roíam as unhas diante da televisão em casa ou em bares espalhados pelo globo.
Mas não.
DeMarcus queria mais.
Não bastava segurar a bola e se estirar no piso verde artificial, mesmo ciente da carga que sofreria por pelo menos dois adversários com descendência de gigantes. No afã de uma consagração, de um golpe de misericórdia, Lawrence resolveu correr. Avançar, dois, três, ou os passos que fossem suficientes para chegar a linha de gol inimiga e anotar os pontos que representariam a última pá da cal sobre um Detroit Lions incansável.
Foi justamente no segundo passo com a bola oval segura no antebraço direito que Demarcus, que também é Lawrence, viu a força de quem não se entrega e sabe que só um milagre pode mudar a história daquele jogo. E assim, a bola, antes recuperada, voltava ao gramado sintético, saltitando tal qual uma galinha tentando escapar de seu destino.
Bola viva.
Pilha de corpos sobre ela.
De volta as mãos dos Lions.
Silêncio nas arquibancadas.
Mas por quê?
Que mistério teria feito com que Lawrence, de primeiro nome DeMarcus, agisse como um principiante, um amador, um calouro e desse ao adversário a chance de continuar a perseguir jardas e com elas manter a esperança de um touchdown consagrador e que representasse uma virada histórica.
Se os Cowboys saíssem derrotados de campo, o mundo já sabia a quem culpar. Nome e sobrenome do responsável, embora, saibamos que todos estão – eu, você, minha vizinha charmosa, a animadora de torcida que nunca para de sorrir, o pai, a mãe, o Espírito Santo – suscetíveis a erros infantis, decisões precipitadas que no segundo seguinte já são como fardos pesados, encharcados de arrependimento.
– O que foi que eu fiz.
Talvez tenha sido essa a frase repetida no consciente de Lawrence. E talvez tenha sido justamente essa a bendita frase que o fez defender seu território com tanto sangue nos olhos no minuto seguinte.
Com tanta garra, tanta determinação. Pois foi ele, DeMarcus. Lawrence. O único que duas, se muito três jogadas depois, furou a marcação cerrada dos Lions para saquear o camisa 9 e impiedosamente fazê-lo soltar a bola.
Ela estava viva de novo.
Pipocando no verde artificial. Ele estava lá. DeMarcus. Lawrence. Com sangue nos olhos. Pronto para saltar sobre a bola e dar fim as dúvidas, aos questionamentos, a tudo que poderia estar sendo dito sobre ele nas arquibancadas e diante de milhares de televisores ao redor do mundo.
Ufa!
Restavam 50 segundos.
Era o fim. A consagração do jogador dos Cowboys. O cara que em um minuto desceu ao inferno e num piscar de olhos voltou aos céus. Ninguém mais tiraria a bola dos seus braços. Não haveria mais jogo. Nenhuma chance sequer do time liderado pelo camisa 9 adversário vencer.
Alívio.
E a certeza que na vida, seja onde for, tudo e nada pode acontecer numa fração de segundos. Foi assim ontem a noite em Dallas.
Inesquecível.
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